quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Crítica ao cristianismo (Osvaldo)


Soa um tanto "romântico" e abstrato demais ainda o fato do homem estar à procura de uma síntese que o justifique em sua existência além daquela que o recoloque em seu papel social, interpessoal e constituinte de uma coletividade.
Eu penso que toda e qualquer abstração ou proposição que tenha implícito uma ordem de incognoscibilidade para o homem apenas o afasta de sua própria compleição enquanto ciência de si mesmo e perda de suas matrizes instintivas.
Dada qualquer circunstância que nos leve para um atributo de atemporalidade, este ainda nos remete a simples contingências que nos desconectam de um estado contemplativo de sermos "solistas" para engendramos nossa própria historia concomitantemente com o tempo a nossa frente; excluindo ou atenuando desta forma um maior vislumbre do bojo existencial ao qual somos inseridos na qualidade de humanos, e da mesma forma sermos menos resistentes a "frustrações" que, em nossa existência, se contrapõem a "idéias" nas quais subjazem certas explanações categóricas que ilustram o ser humano de forma reducionista; esquecendo das premissas ontológicas num sentido mais existencial.
Não adoto nenhuma postura que seja puramente "externa" a mim; ao menos tento preservar o fato de que enquanto homem preciso cotidianamente dar um sentido a tudo e reinventar-me.
Penso que a cultura é nossa meta mais importante, poderíamos perguntar o que acontece com as teorias metafísicas que especulam sobre a natureza fundamental da realidade usando apenas a razão. A possibilidade absoluta da metafísica dificilmente pode ser discutida, portanto também não posso ser radical ao extremo, partindo do pressuposto que tudo está no crivo da razão humana.
Apenas penso que teorias que tentam responder a esta questão estão fora do escopo da investigação humana. Historicamente, esta questão sempre exerceu um fascínio sobre os filósofos, mas que ganhamos ao especular o tempo todo a existência de uma dimensão metafísica? Por que?
Porque somos habitantes de um mundo físico, somente aqui nossos pensamentos e desejos têm uma aplicação; e é através deste processo que o homem deve se aprimorar cada vez mais tendo ciência das idiossincrasias perpetuadas por ele mesmo; e não advindas de uma realidade subjacente; forças antagônicas que anulam o potencial humano e o reduzem ao cataclismo especulativo e escatológico.
O homem precisa bem mais de motivação de suas capacidades latentes do que o constante levantamento de suas temeridades.
Eu mesmo nada posso afirmar em relação à existência de Deus, me posiciono em um patamar agnóstico; nada, além disso.
Carl Seagan: " A ausência de evidencia não evidencia a ausência".
Mas sigo Nietzsche no que diz respeito ao cristianismo como um todo, e toda outra religião de massas. Defendo de certa forma a filosofia budista, sou simpático ao movimento de Richard Dawkins e na questão virtude sigo o raciocínio do amigo Jório.
Mesmo dada existência de Deus, não se pressupõe que o homem tenha que se lograr nesta fé para ter sua formação social e altos valores apreciativos para com seu semelhante, portanto digo novamente que "existir" é o que importa, nossos maiores problemas sociais estão veementemente truncados com uma metafísica não somente das más interpretações de livros sagrados, dogmas e ditames escatologicos e apocalípticos que inculcam uma má fadada moral e virtude para com o outrem, mas também porque o homem é temeroso e covarde de sua própria historia de mundo, de seu existir.
Eu li uma trilogia literária um dia que se chama "Conversando com Deus", que creio que seja uma obra muito rica e para além de nosso tempo para quem quer se livrar do conceito de "demiurgo" do velho barbudo sentado no trono dos céus. O que extrai ainda desta obra é um papel existencial do ser humano, pois deus não vai interferir na tua vida, na minha e de ninguém aqui; você é dado ao mundo, faça sua existência; pois suas ações são inexoravelmente marcas no todo da coletividade, sejam elas boas ou ruins.
Existencialismo também é humanismo.
Bem, vou entrar aqui em defesa de Schopenhauer e sua primazia sobre a ética cristã, isto na minha opinião é singular, pois é dada a natureza humana se referir ao outro e entendo que isto está inserido de certa forma na "compaixão" que cita Schopenhauer.
Agora, Rodrigo meu caro, longe se soar uma atribuição que lhe estou dando, percebo um proselitismo de tua parte ao defender o cristianismo.
Ao que me parece, até bem pouco tempo atrás e inferido de suas postagens passadas, você simpatizava com as "marteladas" de Nietzche acerca da moral estabelecida; e esta é veementemente associada ao transcorrer do cristianismo em nossa historia de humanidade, uma mancha sem precedentes na qual o ser humano foi desprovido de toda sorte de auto-crítica em prol de um sistema infame, pífio, hediondo, expoente do irracionalismo humano e suas idiossincrasias no que refere a uma alteridade do ser humano somente em função de seu ego salvo pelas indulgências do pai e do filho.
Refuto seu pressuposto que na moral cristã estão os exemplos de "valores" humanos, pois estes são em função da "pseudo" salvação do próprio homem, ainda um expoente egóico em detrimento das reais motivações para o bem comum, ou seja, não há a necessidade de uma moral cristã ou outra que seja estabelecida para fundamentar o homem enquanto pré-determinismos para o embate entre o "bem e o mal".
É impossível que toda o boa ação humana seja por causa de uma moral cristã tão somente, ao meu ver, como um existencialista, isto seria apenas uma linguagem para se realizar o desejo, uma ação voluntária inerente ao ser sem o escopo de uma determinação.
Na própria filosofia temos vários autores que mesmo sem a concepção de um criador formulam exemplares passagens acerca de um humanismo.
o cristianismo tolhe completamente o homem, assim eu refuto veementemente este conceito.
Se eu hoje tiver que dar um conselho para alguém que quer seguir uma religião, que este seja budista.
A imagem de Deus está diretamente e inexoravelmente relacionada a uma antropormofização do mesmo como ente paralelo e demiurgo em relação ao ser humano; esta é a carga cultural que todos temos, e vejo em Nietzsche um expoente ao atacar essas mazelas da maior massificação religiosa que existiu.
Eu mesmo já fui evangélico por forças das circunstancias quando era criança, depois fui católico, espírita e tudo foi passando pelo crivo de uma crítica sob a luz de um raciocínio não extemporâneo da realidade que o homem se encontra. A religião e seus conteúdos são meramente muletas existenciais ao homem fraco e acovardado mediante seu existir.
Como já lhe disse, Deus não iria, se fosse o caso, interferir nas ações humanas e tampouco Cristo, pois se você acredita que foi "dado" a existir por parte de uma pré-determinação, dentro disto ainda você iria se defrontar com suas questões existenciais (vide Kierkegaard).
A volatilidade e alta tensão que o ser humano encontra comparados com as premissas evangélicas são inconcebíveis no ponto de vista existencial. Mesmo partindo do pressuposto da vida de Jesus Cristo e sua passagem "existencial" até sua crucificação, ainda resta ao homem ou indagar acerca do absurdo existencial ou dar um salto de fé no fundamentalismo religioso, que via de regra é cego e anárquico no sentido de instintos represados; se fores um homem não tens vocação à santidade, pois esta está em fabulas fictícias somente.
Por que você acha que seria conveniente ao homem ter este conceito "evangelizador"?
Convicções morais de ordem religiosa são, portanto, sempre convicções de grupo, e o grupo é maior que qualquer indivíduo discordante. Com a moral, o indivíduo só pode dar valor a si mesmo como uma função do rebanho. A censura e o controle moral somente podem surgir através do consenso social.
Ela representa o poder daqueles que são individualmente fracos, mas coletivamente fortes. Suas leis os protegerão (eles esperam), assim como justificarão o seu modo de vida.
Não ter a certeza desta metafísica religiosa, ou mesmo nega-la, apresenta um terrível e ao mesmo tempo hilariante pensamento. Terrível porque mos sentimos abandonados por nosso antigo protetor, e ao mesmo tempo hilariante porque subitamente nosso mundo se abre ao infinito. "Qualquer coisa" agora é imaginável, qualquer aventura temerária do conhecimento está permitida outra vez.
Não há nada natural na religião organizada. Pode-se substituir a palavra "natureza" por "neurose", pois não vejo nada natural nisto. A história viu numerosas "epidemias" religiosas (por exemplo, a inquisição, o fundamentalismo, a auto-flagelação corporal e psicológica), mas a aflição, a angustia, o absurdo sempre existiu em algum nível no ser humano.
Resta ao ser humano que tenta refutar a fé cristã um profundo sentimento de condenação por sua própria razão, uma temeridade e temor; parece, de uma maneira terrível, um prolongado suicídio da razão; pois a fé cristã desde o começo é sacrifício, escatologia temerária para o homem, sacrifício de toda liberdade, toda autoconfiança de espírito, e ao mesmo tempo escravidão e auto-escárnio, automutilação.
Kierkegaard embora cristão chamou a fé de "divina loucura", um "absurdo" que requeria um "salto" sobre nossa capacidade de raciocínio. Uma condição de que nenhum desespero existe e também uma formula de acreditar, ou está transparentemente ligado ao poder que o constitui; mas é auto-sacrifício outra vez; neste caso, para salvar seu espírito do desespero.
O homem faz o máximo de seu sofrimento, mas ironicamente, existem elogios à religião quando ela serve ao homem comum. A maioria dos seres humanos encontrará grande consolo nos ensinamentos religiosos.
"aos mansos e humildes será dada posição igual que os mais importantes da terra"; "todos são iguais aos olhos de Deus"; "nossos sofrimentos atuais são uma apólice de seguro para a felicidade futura".
Acreditar em tais idéias traz contentamento para os homens. É necessária uma vontade FORTE para dizer NÂO quando tanto está sendo oferecido.
Desde que existem os seres humanos existem também os rebanhos humanos (grupos familiares, comunidades, tribos, nações, estados igrejas), e sempre muitos que obedecem, comparado com o pequeno número daqueles que ordenam; considerando, por assim dizer, que até agora foi praticado e cultivado entre os homens de forma melhor ou por mais tempo do que a obediência, é justo supor que como regra, ter uma necessidade dela é, por agora, algo inato, como um tipo de "consciência formal" que ordena: você tem que fazer isso incondicionalmente, e incondicionalmente não fazer aquilo, em poucas palavras, uma obrigatoriedade.
Esta necessidade procura ser satisfeita e preencher suas formas com conteúdo: fazendo isso ela agarra tudo a sua volta sem pensar, de acordo com o grau de sua força, impaciência e tensão, como um apetite bruto, e aceita qualquer coisa que qualquer comandante, pai, professor, lei, preconceito de classe, opinião publica, gruta aos seus ouvidos.
O conceito de bem e de mal está inextricavelmente unido à moral cristã; em uma época anterior (pré-moral?) não teria utilidade para o conceito. Aquilo que uma época considera ser o mal é usualmente um eco posterior e extemporâneo daquilo que anteriormente era considerado o bem, o atavismo de um ideal mais antigo.
Desta maneira a mágica, a ausência de deus. A adoração de falsos deuses (satanismo?), o comportamento irracional (esquizofrenia?), o erotismo, foram todos classificados como fenômenos "do mal" do ponto de vista do grupo em uma outra época. Isso porque eles elevavam o individuo acima do grupo, ameaçando a maioria. Que essa ameaça seja chamada de mal!
Por fim peço desculpas se meu texto soa um tanto "acirrado", mas eu particularmente esperava uma crítica sua longe da sombra do cristianismo; ao invés de usa-lo como um fim. E sua suposição de que a bíblia foi alterada, eu diria que ela só existe a partir de seus fundadores sob uma razão coercitiva mediante mistérios insondáveis da natureza humana; é a pior obra que já existiu na vida.
As criticas em relação a Nietzsche mostram duas vertentes; ou você de fato é cristão ou, como a maioria das pessoas, lê-se mais de Nietzsche do que ele realmente escreveu, e o acusa de formar até o nazismo pela precariedade de quem lê de ordem hermenêutica.
A crença evangélica e as igrejas que a ela representa, não são mais naturais para mim. Com os evangélicos e católicos de carteirinha não há diálogo saudável e sustentável; pois eles são "delirantes" a ponto de dar medo e de não querer gastar meu latim.
Um exemplo disso é que o fundamentalismo cristão das pessoas não nos permite uma aproximação "fraterna" sem que elas tirem seus "óculos" da moral de cristo todo poderoso. Não há meio termo aqui, compreende? Ser cristão é inexoravelmente estar preso em uma camisa de forças da irracionalidade humana.

2 comentários:

  1. Muito bom seu entendimento de Nietzsche; somente sua frase de Carl Sagan está fora de contexto - ele se referia a fatos cosmológicos e não a Deus. No geral percebo sua ojeriza à metafísica. Abra-se mais ao imponderável e liberte-se um pouco de Sartre.
    Abraços.

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  2. Osvaldo, retificando o que escrevi: a frase de Carl Sagan que você utiliza está no livro O mundo assombrado pelos demônios, no capítulo A arte refinada de detectar mentiras, e refere-se não a fatos cosmológicos, mas pode servir sim ao seu contexto abordado. Desculpa minha falha.
    Apelo à ignorância – a afirmação de que qualquer coisa que não provou ser falsa deve ser verdade, e vice-versa (por exemplo: Não há evidência convincente de que os UFOs não estejam visitando a Terra; portanto, os UFOs existem – e há vida inteligente em outros lugares no Universo. Ou: Talvez haja setenta quasilhões de outros mundos, mas não se conhece nenhum que tenha o progresso moral da Terra, por isso ainda somos o centro do Universo). Essa impaciência com a ambigüidade pode ser criticada pela expressão: a ausência de evidência não é evidência da ausência.

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